Irmãs Papin |
A sua família tinha um histórico turbulento. Dizia-se que enquanto a sua mãe namorava com o seu pai, estava a ter um caso ao mesmo tempo com o seu patrão. O casal casou-se quando a mãe das irmãs, Clémence, engravidou, e cinco meses depois nasceria Emilia, a filha mais velha do Casal. Mas o marido de Clémence acreditando que ela tinha um caso com o patrão, mudou de emprego e de cidade, obrigando a família a mudar-se. Clémence disse que preferia cometer suicídio a deixar Le Mans. O casamento então começou a ter problemas.
Quando Emília tinha entre 9 e 10 anos de idade, a mãe a mandou para um orfanato católico, onde se descobriu que era vítima de abusos, então foi depois enviada para um convento onde se tornou freira.
Christine nasceu a 8 de março de 1905 e foi entregue a um casal de tios logo após o nascimento, com quem viveu até aos sete anos, quando entrou para um orfanato católico, onde acreditava ter recebido o chamado para ser freira. Clémence proibiu, obrigando a filha a procurar um emprego. Quem a conheceu descrevia Christine como uma mulher trabalhadora, boa cozinheira, mas em alguns momentos insubordinada.
Léa nasceu a 15 de setembro de 1911, foi entregue a um tio materno após o nascimento, com quem viveu até à morte do tio. Depois foi viver num orfanato católico até aos 15 anos, momento em que poderia procurar um emprego. Léa era descrita como quieta e introvertida, no entanto, muito obediente. Era considerada menos inteligente que a irmã Christine.
As irmãs tornaram-se empregadas domésticas em várias casas da cidade de Le Mans e preferiam trabalhar juntas sempre que possível.
Em 1926, arranjaram um emprego como empregadas no nº6 da rua Bruyére, na casa da família Lancelin, onde moravam René Lancelin, um procurador reformado, a sua mulher Léonie e a sua filha mais nova, Genevieve.
Alguns anos depois das irmãs começarem a trabalhar para a família Lancelin, Léonie entrou em depressão e as irmãs tornaram-se o alvo preferido das crises da patroa, ainda que fossem elogiadas pelo trabalho duro e pela limpeza. Os abusos pioraram a ponto de Léonie bater com a cabeça das raparigas contra a parede.
Na noite de 2 de fevereiro de 1933, uma quinta-feira, René Lancelin iria levar Léonie e Genevieve para jantar na casa de uns amigos. Mãe e filha saíram para fazer compras naquele dia e quando voltaram para casa à tarde, encontraram a casa às escuras. As irmãs Papin explicaram que a eletricidade tinha ido abaixo porque Christine tinha usado o ferro de passar.
Léonie ficou furiosa e atacou as irmãs no primeiro andar. Christine então acertou Léonie na cabeça com um jarro pesado. Genevieve atacou as irmãs para proteger a sua mãe. Christine reagiu atacando os olhos da jovem. E em algum momento, Christine ordenou a Léa que arrancasse os olhos de Léonie, o que ela obedeceu.
Christina foi até à cozinha e pegou numa faca e num martelo. Ao voltar para onde estavam as vítimas, o ataque continuou por cerca de meia hora.
Quando o senhor Lancelin voltou para casa, encontrou tudo às escuras. Achou que a mulher e a filha tinha já saído para o jantar e assim seguiu para a casa dos amigos sozinho. Ao chegar à residência, percebeu que a sua família ainda não tinha chegado. Voltou então a casa com o seu cunhado por volta das 19 horas, descobrindo que apenas o quarto das irmãs tinha luz. Suspeitando que algo estava errado, foram até à esquadra da polícia mais próxima e voltaram na companhia de polícias, que quando entraram na casa descobriram os corpos de Léonie e da filha.
As vítimas foram agredidas ao ponto de ficarem irreconhecíveis. Léonie teve os seus olhos arrancados e a sua écharpe estava amarrada em volta do pescoço.
Cena do crime das irmãs Papin |
Inicialmente achavam que as irmãs Papin também pudessem ter sofrido o mesmo destino, o polícia continuou pelas escadas até encontrar a porta do quarto das irmãs trancada. Depois de bater e não receber resposta, arrombaram a porta. Lá dentro encontraram as irmãs nuas, abraçadas na cama, enquanto um martelo ensanguentado, com alguns fios de cabelo, estava numa cadeira ao lado delas.
Perguntadas sobre os assassinatos, elas admitiram, ainda que não soubessem dar um motivo para os terem cometido.
O facto de terem sido encontradas nuas e abraçadas na cama levou a opinião pública e a polícia acreditar que as irmãs mantinham um relacionamento lésbico e incestuoso.
Na prisão as irmãs ficaram separadas uma da outra. Christine ficou bastante irritada por não poder ver nem falar com a irmã, o que levou os polícias da prisão a permitir que as irmãs se vissem.
Em julho de 1933, Christine teria sofrido um surto onde tentou arrancar os próprios olhos, e foi colocada com um colete de forças. No julgamento, Christine admitiu ao juiz que passou por um episódio semelhante no dia dos crimes e que teria sido isso o que levou aos crimes.
O tribunal indicou três médicos para lhe fazerem testes psicológicos nas irmãs para determinar o seu estado mental. Eles concluíram que as irmãs não tinham problemas mentais e foram consideradas sãs, ainda que um relatório médico dado em setembro de 1933 indicasse um histórico de doenças mentais na família. Também acreditavam que o afeto de Christine por Léa era baseado em laços familiares e não num relacionamento incestuoso.
O júri levou apenas 40 minutos para considerarem as irmãs Papin eram ou não culpadas pelo crime. Acreditando que Léa estava sob influência da irmã no momento dos assassinatos, Léa foi sentenciada a 10 anos de prisão. Christine foi inicialmente sentenciada à morte pela guilhotina, porém a pena foi reduzida para prisão perpétua.
As irmãs foram colocadas em prisões diferentes, porém a separação de Léa levou o estado mental de Christine a deteriorar-se rapidamente. Christine tinha episódios de depressão profunda e greve de fome e assim ela foi transferida para um manicómio judiciário em Rennes, na França, onde poderia ter ajuda profissional. Continuou incapaz de comer ou beber e morreu de inanição a 18 de maio de 1937, aos 32 anos.
Léa foi libertada depois de cumprir oito anos de prisão, por bom comportamento. Após a sua liberdade, em 1941, foi morar com a mãe em Nantes, onde assumiu uma nova identidade e passou o resto da sua vida a trabalhar num hotel, como camareira.
Alguns relatos indicam que Léa teria morrido em 1982. No entanto, o cineasta Claude Ventura teria descoberto que Léa vivia num lar na França em 2000 enquanto produzia o seu filme baseado no caso. A mulher alegava ser Léa e estava parcialmente paralisada e sem condições de falar devido a um AVC. A idosa morreu em 2001.
Ainda que tenham sido declaradas sãs para o julgamento, psicólogos ainda se debatem sobre o diagnóstico. Acredita-se que as irmãs sofriam de algum tipo de desordem paranóica ou até mesmo de esquizofrenia paranóica, onde pessoas em grupo ou duplas se isolam do mundo e de outras pessoas, desenvolvendo uma paranóia compartilhada onde a personalidade dominante contra a mais fraca.
Os crimes causaram um grande impacto na França, sendo ainda hoje muito discutida pela comunidade cientifica e pela média. Alguns intelectuais chegaram a sugerir que o crime fora motivado pela luta de classes, devido à exploração das irmãs em longos períodos de trabalho, cerca de 14 horas por dia, com quase ou nenhuma folga semanal.
MZ
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